segunda-feira, 15 de abril de 2013

LAR, DOCE LAR! (PARTE 2)

Como policiais temos dificuldades em nos imaginarmos como vítimas da violência. Nós concluímos que furtos, roubos, invasões de domicílios e execuções só ocorrem com as outras pessoas, mas não conosco. Afinal, NÓS SOMOS OS POLICIAIS. E quem seria idiota o suficiente para tentar furtar, roubar, invadir nossas casas ou nos matar? Infelizmente, o mundo está cheio de bandidos estúpidos que fazem do crime uma profissão. E eles podem atingir qualquer pessoa, inclusive policiais.

Agora preste atenção nos noticiários por um momento. A circunstância principal na qual os policiais são mortos é o PERÍODO DE FOLGA, quando são vítimas diretas de um crime ou interferem num crime em andamento. Alguns criminosos podem atacar intencionalmente policiais uniformizados, suas viaturas ostensivas e os postos onde trabalham para roubar armas e munições. Esses ataques propositais também podem fazer parte de atentados contra a aparente ordem pública e a desejada paz social. Recentemente, porém, nós também temos percebido um aumento num estilo particular de assassinatos de policiais: a “vingança” ou “caçada”.

A polícia registrou mais um ataque a policial na região de Ribeirão Preto/SP. Um capitão da PM foi PERSEGUIDO por dois homens numa moto na noite do domingo (14/10/2012) e levou dois tiros (um na perna e outro na cintura). A vítima dirigia uma caminhonete quando notou que era seguido. Ele contou que os dois homens dispararam seis vezes contra o veículo. O policial conseguiu revidar e acertou os dois atiradores, matando um e ferindo o outro. Apesar de ferido, o policial conseguiu dirigir até o hospital da cidade. Os policiais militares paulistas estão em estado de atenção com os constantes ataques registrados contra a corporação. Foram seis ataques em menos de dois meses entre as cidades de Ribeirão Preto, Franca, Araraquara, São Carlos e Cravinhos. (ESTADÃO, 2012).

Em Aricanduva, zona leste de São Paulo, um policial foi EMBOSCADO por seis homens EM UMA ACADEMIA DE GINÁSTICA, por volta das 21h. Os bandidos dispararam pelo menos dez vezes contra o PM. Os criminosos não roubaram nada da academia nem da vítima. (R7 NOTÍCIAS, 2012).

No domingo (17/06/2012), mais um policial militar foi MORTO QUANDO CHEGAVA EM CASA, no bairro São Mateus, zona leste de São Paulo. Segundo a polícia, o crime aconteceu por volta das 9h, quando ele chegava do mercado com a mulher e a filha. (R7 NOTÍCIAS, 2012).

Pense sobre esses incidentes e suponha que você é o alvo de qualquer dos ataques. O que aconteceria? O que você faria? Como reagiria ante a possibilidade de alguns criminosos reincidentes seguirem você, sua esposa e seus filhos até sua casa para fazê-los as próximas vítimas? Certamente, essas são questões perturbadoras. Contudo, ainda mais perturbadoras são as possíveis consequências de tais incidentes.

Outra certeza que devemos ter é que a violência pode ocorrer com qualquer um de nós. A ideia de se tornar a próxima vítima pode provocar o desejo de nos tornarmos alvos difíceis para os criminosos. Existem indivíduos perversos desejando fazer coisas aterrorizantes, e muitos deles sequer se importam se somos policiais ou não, se estamos trabalhando ou descansando, se estamos sozinhos ou com nossas famílias, se ainda vibramos com a atividade policial ou se já "jogamos a toalha".

Nós não podemos impedir a intenção criminosa do delinquente, mas podemos nos tornar alvos mais difíceis de acertar para que os bandidos escolham outras pessoas. Isso parece insensível, mas sabemos que criminosos são preguiçosos. Se entre invadir uma casa protegida (com muro alto, concertina, cerca eletrificada, cachorro e um sistema de alarme) ou outra onde os moradores deixam a porta aberta, todos nós sabemos que o criminoso seguirá pelo caminho mais fácil. Portanto, tornar-se um alvo difícil começa exatamente com regras domésticas.

Existem coisas simples que você pode fazer para tornar todas as pessoas em sua casa mais seguras. A primeira e mais fácil delas é sempre trancar as portas e as janelas. Não importa se você vive numa cidade do interior ou na capital, sempre tranque as portas, portões e janelas. Existem muitos casos de bandidos que invadiram residências por uma porta ou janela aberta. Obviamente, uma porta trancada não vai impedir um invasor determinado, mas isso pode atrasá-lo o suficiente para que você alcance sua arma de fogo. E isso nos conduz ao próximo ponto: sempre porte sua arma quando estiver de folga e sempre tenha uma arma de fogo ao alcance das mãos quando estiver dentro de casa. Quando for dormir, ponha a arma ao lado da cama. Aproveite a oportunidade para deixar um telefone celular e uma lanterna acessíveis.

Quantos de nós já chegou em casa simulando uma entrada ou uma progressão, fez um fatiamento dos cômodos para verificar se o local está seguro (“limpo”)? Você pode conhecer cada centímetro da sua casa, mas já tentou progredir e fatiar os ambientes no escuro enquanto empunha sua arma? Saiba antecipadamente o que você deve fazer para ir de um cômodo ao outro; como fará o deslocamento no corredor; como realizará o fatiamento antes de entrar em cada quarto da sua casa enquanto seus filhos ainda dormem. Pense nisso e pratique de vez em quando antes que algo real aconteça. Pratique as técnicas que pretende usar com sua arma em total segurança (sem munição, sem carregador e travada).

Outras coisas simples que você pode fazer em casa é manter as cortinas/persianas fechadas durante a noite. Não dê aos criminosos a oportunidade de ver o layout de sua casa, cobiçar as coisas que você possui e saber exatamente onde você está dentro de sua casa. Durante o dia você pode observar com alguma facilidade alguém “investigando” sua casa ou seu prédio. Mas durante a noite essa pessoa pode se esconder a poucos metros de um local iluminado e não ser notado por quem está dentro de casa.

A maioria de nós não possui condições de instalar um sistema de alarme e de monitoramento de primeira linha ao redor de nossas casas. Mas existem alternativas mais acessíveis, tais como um cão (não precisa ser uma fera, mas um que faça o máximo de barulho com a aproximação de estranhos), trancas nas portas, grades, cercas eletrificadas, concertinas, etc. Mas o melhor e mais barato dispositivo de segurança preventiva é o estado de alerta. Assim, antes de sair de casa (a pé ou de carro) verifique a rua onde mora a procura de pessoas suspeitas que estejam na calçada ou no interior de carros ou motos.

Evite receber correspondências relacionadas ao trabalho policial na sua residência. Peça a empresa que envie o material para o seu local de trabalho. Sempre preencha cadastros com o endereço do trabalho como sendo o residencial. Não é preciso que os vizinhos saibam que você trabalha na polícia.

A mesma ideia vale para o seu uniforme ou para qualquer parte dele (coturnos e calças operacionais). Se for possível, evite sair ou chegar em casa com esse tipo de roupa. Um criminoso, mesmo o mais idiota, pode identificar um uniforme a quilômetros de distância.

Mude o trajeto da sua casa para o trabalho. Varie essa rota e cheque pelo espelho retrovisor se você não está sendo seguido. Se você suspeitar que está sendo seguido, faça algumas conversões (dobre algumas esquinas) ou circule o quarteirão para se certificar de que o veículo de fato o segue. Não vá para casa de jeito nenhum.

Sabemos que não devemos levar trabalho para casa, mas a verdade é que o trabalho sempre nos persegue. E basta portar uma arma, a carteira funcional e a agenda do celular com os números dos colegas para que isso aconteça. Sabemos também que as políticas de segurança pública são patéticas e que os cidadãos não possuem o direito de se defenderem por meio das armas de fogo. Num cenário como esse, fico incomodado em saber que alguns policiais não portam armas quando estão de folga. Outros sequer possuem armas próprias em casa. Outros ainda vão para o trabalho sem uma arma de fogo. Sinceramente, um dos melhores benefícios do trabalho policial é ser capaz de portar uma arma de fogo em qualquer situação mesmo após a aposentadoria.

Em uma sociedade realmente moral e civilizada, as pessoas somente interagem pela persuasão. A força não tem lugar como método válido de interação social e a única coisa que remove essa força da equação é uma arma de fogo, por mais paradoxal que isso possa parecer. Quando eu porto uma arma, você não pode lidar comigo pela FORÇA. Você precisa usar a RAZÃO para tentar me persuadir, porque eu possuo uma maneira de anular suas ameaças ou uso da força. A arma de fogo é o único instrumento que coloca em pé de igualdade uma mulher de 50 Kg e um assaltante de 105 Kg; um aposentado de 75 anos e um marginal de 19, e um único indivíduo contra um carro cheio de bêbados com bastões de baseball. A arma de fogo remove a disparidade entre força física, tamanho, número de agressores em potencial e alguém se defendendo. Quando eu porto uma arma, eu não o faço porque estou procurando encrenca, mas porque espero ser deixado em paz. A arma na minha cintura significa que eu não posso ser forçado, somente persuadido. Eu não porto umaarma porque tenho medo, mas porque ela me permite não ter medo. Ela não limita as ações daqueles que iriam interagir comigo pela razão, somente daqueles que pretenderiam fazê-lo pela força. Ela remove a força da equação. E é por isso que portar uma arma é um ato civilizado. Então, a maior civilização é onde todos os cidadãos estão igualmente armados e só podem ser persuadidos, nunca forçados.(CAUDILL, USMC).

Você também deve praticar com sua arma simulando condições fora do serviço, já que praticamente nenhuma organização policial promove qualquer treinamento com o uso velado da arma. Ao invés de verificar quantos impactos atingiram o alvo de papel, realize algum treino mais próximo do razoável para situações de risco. Simule que você está numa farmácia durante um assalto, seus braços estão levantados (posição de rendição) e você está de frente para o criminoso. Olhe a sua volta para identificar um comparsa. Treine como seria levantar a camisa, sacar RÁPIDO e atirar contra o bandido. Grite “polícia”. Olhe a sua volta novamente. Onde está o comparsa agora? Dica: nunca levante as mãos muito para o alto. Se você for abordado e os criminosos ordenarem que você levante as mãos, faça isso de modo que elas fiquem na altura dos ombros, no máximo. Desse modo, você pode alcançar sua arma com mais RAPIDEZ sem ter que fazer um movimento brusco e muito longo.

Se você estiver a pé, talvez indo para o ponto de ônibus, tenha um nível de atenção que possa abranger 360° a sua volta. Essa área deve se estender alguns metros adiante. Dependendo do lugar, do horário, etc., talvez você precise ampliar esse alcance. Procure identificar as pessoas e o que elas estão fazendo. Qualquer pessoa que pareça suspeita deve ser foco da sua atenção.

Mantenha um telefone celular sempre ao alcance e com bateria plena. Considere não inserir códigos de segurança ou bloqueio de teclas que possam atrasar ou dificultar uma ligação de emergência. Configure as teclas de discagem rápida do seu celular para ser capaz de discar para a polícia ou para algum colega. Ligar para o 190 é bom, mas muitas vezes é melhor ligar para um colega que é seu AMIGO DE VERDADE. Por isso também é importante fazer amigos em todas as polícias. Mas dependendo da organização policial onde você trabalha é preciso saber para quem NÃO se deve pedir ajuda, ainda que seja o colega da sala ao lado.

Estas são apenas algumas dicas que podem tornar sua vida e a vida das pessoas que você ama mais seguras. Isso não tem nada haver com ser paranoico; tem haver com estar alerta em relação aquilo e aqueles que estão a sua volta. Tem haver com estar preparado e ter um plano de ação porque muitas vezes os criminosos nos transformam em vítimas de seus crimes. Portanto, não seja uma vítima; tenha um plano; tenha um plano B; reaja; e faça com que os criminosos se arrependam de terem cruzado o seu caminho.

Arma é Civilização, Major L. Caudill, Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA (USMC).

Humberto Wendling é Agente de Polícia Federal e Professor de Armamento e Tiro lotado na Delegacia de Polícia Federal em Uberlândia/MG.